Afinal, o que é reciprocidade no amor?
Para alcançar a reciprocidade em um relacionamento, é preciso quebrar algumas barreiras emocionais e sociais
egundo o dicionário Michaelis, reciprocidade é a “troca mútua de direitos ou privilégios”. Quando falamos de política, por exemplo, não há muito segredo. Uma manchete recente do noticiário internacional diz que o “Brasil adotou reciprocidade e expulsou embaixadora da Nicarágua” – ou seja, a decisão foi tomada tendo em vista o princípio da reciprocidade, que consiste em aplicar a outro país as mesmas regras aplicadas ao Brasil.
Mas e quando a palavra é aplicada no amor? Um sentimento, algo subjetivo, em que não há manuais de regras ou leis oficiais? Sim, pode ficar bem mais difícil de descrever, racionalmente, o que é reciprocidade nesse caso, já que está sujeito a diferentes interpretações. Já falamos aqui na CAPRICHO, por exemplo, sobre a Teoria do Apego, que mostra como a qualidade dos vínculos formados na infância influencia na forma em que o indivíduo percebe se suas relações e o que é recíproco.
Então, talvez, começar pelo caminho oposto, olhando para o que não é recíproco no amor em geral, seja uma forma mais fácil de entender o que realmente é.
bell hooks, em ‘Tudo sobre o amor: novas perspectivas’*, escreve sobre a reciprocidade a partir da questão de gênero. Ela aponta que o grande inimigo da reciprocidade no relacionamento é o jogo de poder, alimentado pelo pensamento patriarcal e machista da nossa sociedade. Segundo a autora, enquanto os homens ainda veem o amor como coisa de mulher e buscam no relacionamento alguém para cuidar de todas suas necessidades, as mulheres são encorajadas a acreditarem que devem ser amorosas e priorizarem o apego emocional e a conexão.
hooks enfatiza que o amor não prevalecerá em qualquer situação em que uma das partes, seja feminina ou masculina, em relacionamentos heterossexuais ou homossexuais, queira manter o controle e dominar. Segundo a autora, a melhor maneira de romper essa dominação e começar a prática do amor é por meio da da doação e da generosidade – e é aí, doando-se uns aos outros, que aprendemos a experimentar a reciprocidade.
“Para curar a guerra entre os gêneros baseada na luta por poder, mulheres e homens escolhem fazer da reciprocidade a base de seus vínculos, garantindo que o crescimento de cada pessoa seja importante e estimulado”, escreveu.
Em entrevista recente à CAPRICHO, a criadora de conteúdo Luana Carvalho, do podcast ‘O bom mesmo é ser emocionada’, contou que se descobriu, com orgulho, uma mulher emocionada quando foi contrária aos jogos de desinteresse que foi ensinada desde cedo para conquistar alguém. A partir daí, ela também começou a aprender que sua intensidade não era problema se ela soubesse a quem oferecer, com a consciência que não precisamos suprir tudo que a outra pessoa precisa.
Afinal, um casal é formado por dois indivíduos singulares, que têm formas distintas de se doar e expressar os sentimentos. Tentar medir a intensidade ou os gestos de uma pessoa a partir da sua própria régua pode gerar frustração. Ao invés disso vale entender o quanto o outro está disposto a fazer o relacionamento dar certo e te fazer feliz.
Rosa Claudia, psicóloga e fundadora do Núcleo de Atendimento ao Amor Patológico (NAPA), explicou, entrevista à CH sobre o tema amor, que, para viver uma relação saudável, é importantíssimo que haja movimento e fluidez. Tem momentos que uma das pessoas está mais envolvida do que a outra, aí depois os dois ficam na mesma sintonia, até que um fica mais distante por um tempo por questões da vida e depois as coisas se equilibram novamente e por aí vai. Isso é sinal de reciprocidade também.
Como escreveu a psicanalista Ana Suy, em ‘A gente mira no amor e acerta na solidão’* , “amar é se haver com a insuficiência do outro, que denuncia a insuficiência de cada um. Isso que estou chamando de insuficiência não precisa ser da ordem do sofrimento, mas pode ser justamente aquilo que nos anima na vida. Somos seres faltantes e isso não é um problema”.
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