Casamento às Cegas Brasil expõe síndrome de Peter Pan de Thiago e cia
Meninos perdidos? Falas e atitudes dos participantes, em especial do noivo de Nanda Terra, mostram o quão puxado é ser uma mulher f#d@
Existe uma comédia romântica bem babaquinha de 2011 chamada Qual Seu Número?. Tem até na Netflix e na Amazon, caso você queira assistir. É estrelada pela Anna Faris, tem o Chris Evans e o Chris Pratt. É bobinha, mas é legal. Dá pra se divertir. Mas é aquele típico filme chick lit em que a protagonista vive um dilema romântico bem machista. No caso, o de Ally é encontrar um marido entre seus ex-namorados, já que leu em uma revista feminina que mulheres que transam com mais de 20 caras dificilmente se casam – e ela já havia alcançado esse número.
Nos últimos dez anos, muitos questionamentos vêm sendo feitos e a indústria do cinema vem se adaptando para não levar bomba dos problematizadores de plantão. Que bom, pois muita coisa mudou para melhor! Só que talvez, pela primeira vez em muito tempo, a ficção não esteja mais refletindo tão fielmente a realidade, uma vez que o machismo continua com força total fora das telas. É por isso que os reality shows nos pegam tão de jeito e nos incomodam em diversos sentidos.
Qual é o seu número, Thiago?
Por exemplo, toda a 1ª temporada de Casamento às Cegas Brasil está prestes a ser lançada pela Netflix. A premissa é a mesma do original gringo: casais se formam durante um experimento e ficam noivos sem nunca terem se visto, apenas se baseando na voz e no papo. Depois, eles partem para uma breve lua de mel, para testar a química, e vão morar juntos, para testar a convivência. Se o amor vencer, eles dizem sim no altar e se casam, provando que o amor é cego – mas seria bom se ele fosse surdo também, viu?
Um personagem em especial revoltou muitas espectadoras mulheres: Thiago Rocha. O paraquedista parece ter parado no tempo e viver como se estivesse na comédia de 2011. “Eu não gostaria de me casar com uma mulher que já passou por milhares de homens. É uma coisa muito forte você saber que sua mulher já ficou com vários caras”, disse no 6º episódio para sua noiva, Nanda Terra. Ele ainda falou que não é legal uma mulher sair por aí falando abertamente sobre seu passado, ainda mais se tiver muita bagagem. Só que para os homens está liberado ter um passado, de qualquer tipo! “É machismo, sabe? A gente come todo mundo. Foda-se. A gente quer comer todo mundo“, soltou em uma uma tarde pós-bebedeira.
O good vibes tóxico
Em um episódio anterior, Thiago Rocha já tinha feito sangues ferverem. Durante um churrasco, a galera começou a falar sobre a experiência nas cabines e questionar se alguém havia ficado na dúvida. Nanda, sua noiva, disse que sim, algo que todos já sabiam. O paraquedista ficou ofendidinho e descontou na participante Ana Prado, que foi defender a amiga. “Bota tua mulher no eixo, tá?”, disse para o Shay, noivo de Ana. A modelo retrucou, ao que Shay concordou falando em um “direito das mulheres” não muito convincente.
O participante natural de Floripa, que ele faz questão de dizer com ar xavequeiro que é a ~Ilha da Magia~, também soltou outras pérolas, como: “Vocês concordam que a mulher é o sexo frágil?”; “Eu sempre sonhei em me casar com uma mulher mais calminha, que não tivesse passado” e “Mulheres são influenciáveis”. Durante sua DR com a noiva, que ficou desgostosa ao ouvir tantos posicionamentos machistas, o cara chegou a sugerir que Nanda e ele virassem “brotherzaço”, caso não se casassem, e tivessem uma “amizade colorida”. Ao dizer que não ia fazer nenhuma das duas coisas, o noivo rebateu com um irritante: “Você está bem estressadinha hoje”.
Cachorro é foda né? Sentiu a energia do Thiago de longe e ainda tacou a mordida no nariz dele, e esse paspalho ainda chamou o Tobias de bode, como tu deixou passar Nanda Terra?? Eu expulsava da minha casa #CasamentoAsCegasBrasil pic.twitter.com/2hjx6mFwsL
Continua após a publicidade— sam 👒 (@andthsix) October 13, 2021
Além de todas as falas e atitudes machistas, Thiago se mostra um verdadeiro exemplo de homem para não seguir: ele se acha a última bolacha do pacote, sabe que é machista mas não faz a mínima questão de evoluir, botando toda a culpa na sociedade, e se mostra zero companheiro. “Você paga por isso?”, disse para Nanda quando foi visitar sua clínica de estética e conhecer o trabalho que ela faz. Só que tudo isso ele esconde embaixo da casca de “homem pra frentex good vibes”, que ama a natureza, adrenalina, viajar… Um dos piores tipos da espécie, popularmente conhecida como “esquerdomacho”.
A síndrome de Peter Pan
No Instagram, Thiago Rocha se defendeu dos ataques que vem sofrendo nas redes sociais sobre seu comportamento. Em um dos Stories, ele chegou a dizer que não se sentiria “oprimido” (O-P-R-I-M-I-D-O), porque sabe que é uma pessoa boa, e pediu para que geral continuasse falando dele, bem ou mal, pois estava gerando engajamento. Típico. Ele assumiu que passou vergonha e falou algumas coisas que não deveria, mas deu a entender que a edição do programa o transformou injustamente em um vilão. Thiago Rocha tem 34 anos e é vivido, já morou alguns anos na Nova Zelândia e tal, mas no fundo parece um adolescente que ainda não sabe muito bem o que deseja da vida. Ou até tenha um e outro plano, como sair do Brasil, mas não esteja preparado para viver uma vida a dois, pois justamente acha incrível demais essa vida de solteiro tóxico. Mas por que entrou no reality então?! Inclusive, no 1º episódio ele diz que tem um filho de 7 anos e nunca mais tocou no assunto.
Outros participantes também demonstram sofrer da Síndrome de Peter Pan, que é quando pessoas se negam a crescer, tendo comportamentos infantis e sonhando com uma Terra do Nunca que não existe. Shay, noivo de Ana Prado, é fofo, mas bem crianção, especialmente no que diz respeito às tarefas de casa. É claro que tem o fator cultural [Shayan é iraniano], que também tem relação com alguns machismos dele no programa, como achar que a mulher tem o dever de cuidar da casa e por amor. A própria modelo recentemente acusou o empresário de usar a imagem da filha dela, de 3 anos, para se defender das críticas que havia recebendo. “O uso da imagem de uma criança para se autopromover, para fundo lucrativo e afins, além de cruel, é criminoso”, escreveu no Twitter [a publicação foi apagada na sequência]. A cultura tem peso sobre muitos comportamentos do participante? Sim. Mas ela não justifica, até porque, apesar dos costumes, Shay escolheu viver no Brasil e disse ser diferente dos demais familiares, que são mais tradicionais. Talvez ele não faça por mal, mas a desconstrução é urgente. Trinta anos ainda é novo nos dias de hoje e tal, mas tem que crescer, Shay!
Casamento ás Cegas Brasil pode ser resumido da seguinte forma: mulheres independentes e seguras flertando com caras de comportamento duvidoso que mostram seu pior lado cada vez que elas se mostram firmes com seus posicionamentos.
— vic (@borboletando conta nova) (@victoriakavic) October 14, 2021
Líssio, Hudson e Rodrigo são os outros noivos que também demonstram atitudes, bem pontuais, carregadas de irresponsabilidade afetiva, muitas delas por causa desse medo de crescer, amadurecer e se comprometer – mesmo se mostrando mais dispostos a isso. Alguns comportamentos são chatos e incomodam bastante, ainda mais que absolutamente todas as mulheres de Casamento às Cegas Brasil são “maravideusas” independentes, feministas e de personalidade forte, mas ainda assim são menos problemáticos. O líder mesmo dos meninos perdidos é Thiago – desculpa aí, Peter! – e a gente sabe que tem um lance de as pessoas estarem saindo da casa dos pais cada vez mais tarde, e que vários fatores levam a isso; que homens amadurecem depois das mulheres, e isso é cientificamente comprovado; mas tem coisa que não dá mais pra permanecer igual ao que era nas comédias românticas clichês dos anos 2000 nem justificar falas culpando exclusivamente o machismo estrutural e querendo surfar em cima dessa ideia de “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. Quando a pessoa está disposta a mudar é uma coisa (e uma das grandes já!), agora, quando ela quer visivelmente continuar no seu mundinho Neverland, não dá pra defender toda a toxidade pelo indivíduo causada.