As mulheres empoderadas que devemos celebrar dentro do K-pop

Super talentosas, elas representam uma força feminina empoderadora dentro do movimento e merecem mais do que apenas serem respeitadas

Por Gustavo Balducci Atualizado em 31 out 2024, 02h24 - Publicado em 9 mar 2019, 10h00

A indústria do entretenimento sul-coreano sempre enfrentou uma onda conservadora, que pode ser intitulada como antifeminista. A Coreia do Sul é um país que ainda convive com uma discriminação sexual profunda e constante em sua sociedade. Ideais feministas ou políticas que abordam questões raciais, de gênero ou sexuais ainda são tabu no país. Com a internet, as críticas seguem através dos ataques digitais, dos quais alguns idols já foram vítimas de retaliação por atitudes ou postagens consideradas “feministas demais”.

Kpop_feminismo
Reprodução/CAPRICHO

A cantora Irene, integrante do girlgroup RED VELVET, contou durante uma coletiva que estava lendo o livro Kim Ji Young, Nascida em 1982, um bestseller com milhares de cópias vendidas desde o seu lançamento em 2016. O título tem sido aclamado como um guia do feminismo para muitas mulheres no país e foi usado como arma para diversas acusações contra a jovem. Os fãs masculinos do grupo compartilharam suas indignações nas redes sociais, acusando Irene de “ser feminista”. As reações hostis se tornaram campanha para deixar de apoiar as promoções do grupo, procurando atingir vendas, apresentações e shows delas. Alguns fãs ainda queimaram fotos da jovem e conteúdos promocionais que continham sua imagem.

“Alguns fãs imaginam suas idols favoritas como seu tipo ideal de mulher. Quando o objeto de suas fantasias mostra comportamentos que vão contra a imaginação, como a leitura de um livro associado ao feminismo, isso provoca uma forte reação”, diz o pesquisador Ahn Sang-soo, do Instituto de Desenvolvimento de Mulheres da Coreia.

Este sentimento não é exclusivo do ambiente online, onde o anonimato ganha espaço para discursos de ódio. De acordo com o site Koreabizwire, uma associação anti-feminismo com aproximadamente 2.800 membros foi à Prefeitura de Seul em dezembro de 2017 reivindicar que o Ministério da Igualdade de Gênero e Família fosse desfeito.

E a onda anti-feminista não vem só do público, não. O rapper San E – um dos mais bem sucedidos – lançou em 2018 a faixa Feminist, expondo sua opinião sobre o estado atual do feminismo na Coreia. Com duras falas sobre o movimento, ele alega que as mulheres são oprimidas da mesma forma que os homens e diz que não entende porque ainda falam que homens e mulheres não são iguais, uma possível referência à diferença de nível salarial do país.

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Porém, o cantor foi infeliz por não saber que a disparidade salarial entre homens e mulheres na Coreia do Sul é a mais alta da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Segundo um relatório de 2017 da própria OCDE, as mulheres na Coreia ganham apenas 63% do que os homens ganham e tem mais: apenas 56,2% das mulheres no país estão empregadas atualmente. Na faixa, o ex-integrante da grande empresa JYP Entertainment ainda finaliza questionando por que as mulheres não são obrigadas a servir ao Exército Nacional assim como os homens são, embora comentários em seu Instagram apontem que o próprio San E não serviu o Exército.

Mesmo escrevendo que não odeia as mulheres e que as respeita, San E anteriormente foi alvo de críticas, após seu comportamento abusivo e inapropriado no decorrer de uma apresentação ao lado da cantora Irene.

Com a efervescente influência do #MeToo pelo mundo e fluindo contra essa onda misógina, o K-pop também vem apresentando um novo comportamento, dessa vez com atitudes mais democráticas, que se apoiam sobre discursos de tolerância e igualdade. Embora o fantasma da desigualdade ainda paire sobre o ritmo, devemos celebrar as mulheres que dão voz e estão construindo um novo momento para a cena. Estas cantoras conseguiram desdobrar sua imagem – muita vezes hiper sexualizada -, e se transformaram em uma forte arma empoderadora dentro do K-pop!

Hwasa e Hyolyn: meu corpo, minhas regras

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Ambas são performers brilhantes e cantoras impecáveis, mas ainda são vítimas do machismo desenfreado. Hwasa é destaque absoluto por seus vocais únicos e sua postura badass. Junto ao restante do MAMAMOO, com quem já atua há 5 anos, o grupo deixou o público de boca aberta com sua apresentação durante o MAMA AWARDS 2018. Na ocasião, as garotas ainda levaram o prêmio de Artista Vocal Favorito, mas mesmo ganhando um dos principais títulos da noite, o principal assunto nos noticiários do dia seguinte foi o figurino usado por Hwasa durante a premiação. O traje vermelho foi um dos mais pesquisados e acessados do portal NAVER, e os usuários criticaram duramente a escolha das peças, o exagero de exibição corporal e os movimentos sexy da coreografia das meninas. Para responder à altura, o grupo rebateu: “Nós não sabíamos que o traje se tornaria um tópico de discussão. Acabamos escolhendo uma roupa que se encaixa bem com a música que estávamos cantando no palco, como costumamos fazer. “

Passeando muito bem entre raps e melodias, Hwasa estreou seu primeiro single solo, TWIT, em fevereiro. Zombando de um amante que não a merece, ela vibra e seduz ferozmente no videoclipe produzido sob sua colaboração criativa.

Já a rainha do rebolado, Hyolyn, chocou o público presente durante o KBS Drama Awards por se apresentar com uma “aparência estranha e desconfortável”. Tudo porque a ex vocalista do SISTAR preparou uma envolvente versão para emplacar os poderosos solos de See Sea e Dally.

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Os membros da plateia foram vistos mordendo os lábios constrangidos enquanto esperavam que a cantora terminasse sua performance. Os internautas alegaram que a cantora estava vestindo uma roupa apertada demais e que havia muita pele à mostra.

Hwasa e Hyolyn tiveram chance de expor suas impressões durante o programa Radio Star, da rede MBC. Dizendo ter se divertido com as caras assustadas e constrangidas da plateia, Hyolyn afirmou ter ficado surpresa com a situação envolvendo seu look e completou: “Essa roupa foi feita à mão por um designer e é a única que existe no mundo. É uma roupa que comprei porque queria usar algo incrível no meu concerto solo. Eu queria usar a roupa mais luxuosa e incrível daquele evento. Acho que acertei”, brincou a cantora.

Hawsa partilhou de pensamentos semelhantes e se solidarizou com Hyolyn: “Não acho que é importante o que eu estou usando. Em vez disso, penso no que posso usar para melhorar ainda mais meu desempenho no palco ou como posso fazê-lo bem.”

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HyunA: uma polêmica necessária

HyunA sempre esteve envolvida em polêmicas sobre sua carreira. Passando pelos grupos 4MINUTE e Wonder Girls, a jovem cheia de atitude se consolidou como solista em diversos singles e colaborações famosas, incluindo sua participação no fenômeno Gangnam Style, do icônico PSY. Em 2018, HyunA voltou para os holofotes após declarar via Instagram que estava em um relacionamento amoroso com E’Dawn, integrante do grupo Pentagon, há quase dois anos. O namoro, quase sempre vetado por todos os contratos, levou a expulsão da cantora junto de E’Dawn. Após notificar a imprensa e os fãs, a empresa Cube Entertainment sofreu uma brusca queda em suas ações, impulsionada pela comoção dos fãs e da mídia em respeito ao casal. Logo que deixou a gravadora, a cantora se mostrou cada vez mais contente e livre em suas redes sociais. Sua aparência e atitude ainda continuam sendo objeto de julgamento pelos netizens, mas suas postagens mostram uma versão esperançosa e livre conquistadas com a quebra de contrato.

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Hoje, ambos assinaram com a mais nova gravadora do país, a P NATION, inaugurada pelo amigo PSY. P NATION é uma promessa para novos tempos dentro do K-pop. Psy, que anteriormente estava sob o selo da YG Entertainment – outro nome fortemente vinculado a polêmicas – decidiu abrir sua própria empresa de entretenimento. Nomes grandes como CL vêm sendo cotados para também se livrar das garras empresariais e estrelar na nova casa do idol.

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#welcome @hyunah_aa @hyojong_1994 #hyunah #edawn #pnation #피네이션

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Talentosa e extremamente versátil, HyunA é uma das mais conhecidas artistas sul-coreanas do momento, representando um papel fundamental para as mulheres no K-pop.

Sunmi: likes e saúde mental

Sunmi já foi um dos destaques do nosso especial celebrando as garotas mais poderosas do K-pop. Seu EP, Warning, foi aclamado pela crítica e teve enorme sucesso comercial, fazendo dela uma das artistas femininas mais comentadas no K-pop no ano passado. A eternizada Gashina faz parte do cenário há mais de 10 anos e foi performada pela cantora como forma de luta contra coreografias “inapropriadas” para a TV, além de responder críticas sobre seu corpo e outras controvérsias.

Estrelando sua nova faixa este mês, em NOIR temos Sunmi mostrando o melhor e o pior lado das redes sociais. Enquanto um bolo pega fogo, ela tira uma boa selfie para seus fãs. Sem exibir grandes movimentos ou coreografia – algo quase inédito no K-pop – a faixa expõe a falsa ideia de felicidade e beleza #NOFILTER imposta sobre as mulhere e mostra como isso pode nos tornar pessoas carentes ou afetar nossa saúde mental.

Escola para garotas destemidas

A dominação mundial do BLACKPINK trouxe muito material para ser estudado e explorado por outros grupos femininos. O quarteto encabeça uma maior liberdade para as garotas: ambas possuem contas individuais no Instagram, muito bem engajadas. Suas letras falam sobre amor próprio e criticam as ações negativas da mídia. Seu último single, DDU-DU DDU-DU, entrou para a 55º posição da parada Hot 100 da Billboard, enquanto o videoclipe se tornou um dos mais vistos em 24 horas de todos os tempos no Youtube. Seguindo os passos começados pelo conterrâneo 2NE1, podemos ver um legado sendo muito bem executado por outros nomes como CLC, MAMAMOO, APINK e (G) I-DLE.

Que tal finalizar com esses outros hits para lembrar que todo dia é dia das mulheres?

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