Por que seria tão importante Lula indicar uma mulher para o STF

A falta de representatividade no topo do Judiciário atrapalha nossa democracia. Vem entender!

Por Juliana Morales Atualizado em 29 out 2024, 18h49 - Publicado em 31 mar 2023, 12h06

Ao que tudo indica, Lula perderá a chance de fazer história, indicando pela primeira vez uma mulher negra para o Supremo Tribunal Federal, na vaga que ficará disponível no dia 11 de abril, com a aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski. Tem muita coisa em jogo nessa escolha, viu? Conversamos com especialistas e vamos te explicar!

Apesar da pressão de juristas e ativistas do movimento feminista e negro, o nome mais forte para a indicação, no momento, ainda é masculino e branco. Cristiano Zanin, advogado que defendeu Lula nos processos da Operação Lava Jato, é a principal aposta para o cargo.

Se você se perguntou se isso pode, a resposta é sim! Em termos jurídicos, a possível escolha é válida (mais para frente vamos te explicar quais são os requisitos para ser indicado ao STF – mas Zanin cumpri todos eles). O problema é que ela reforça um cenário de falta de representatividade, o que não é nada legal para a nossa democracia.

Olha o cenário atual: dos 11 ministros que compõe Suprema Corte brasileira, são oito homens e apenas duas mulheres: Rosa Weber, que inclusive é a atual presidente do STF, e a ministra Cármen Lúcia. Todos os membros são autodeclarados brancos. Nem precisamos falar que essa composição – assim como as anteriores – é altamente discrepante na questão de gênero e raça, né?

Além das duas ministras, apenas mais uma mulher ocupou uma cadeira do STF em toda a História: a pioneira Ellen Gracie. A magistrada carioca foi nomeada em novembro de 2000, pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso.

Ellen se aposentou em 2011 e quem assumiu sua vaga foi Rosa Weber, nomeada pela então presidente Dilma Rousseff. Mas, antes disso, em 2006, a jurista e professora Cármen Lúcia foi indicada pelo presidente em exercício, Luiz Inácio Lula da Silva, tornando-se a segunda mulher a ser ministra do STF.

Indicar um nome feminino agora, ainda mais no lugar de um homem, ajudaria a diminuir, ao menos um pouco, a composição tão desigual. Além disso, em outubro, será a vez da ministra Weber se despedir do STF e mais uma vaga será aberta.

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Por que é tão importante mais mulheres no STF?

O Supremo Tribunal Federal, que está no topo da hierarquia do Poder Judiciário, é o responsável por garantir que a Constituição Federal – que é a lei mais importante do país – seja respeitada e cumprida.

Então, cabe ao STF julgar se as ações do Executivo (presidentes e ministros que administram o país) ou do Legislativo (deputados e senadores que criam as leis) estão de acordo com o conjunto de regras que regem a sociedade brasileira.

“Não me parece democrático ter uma corte constitucional em que a representatividade feminina é tão baixa.”

Gabriela Araújo, professora de Direito Constitucional na PUC-SP e autora de um livro sobre mulheres na política, destaca que muitos temas tratados na Suprema Corte estão relacionados a questões que impactam diretamente a vida das mulheres.

“Com a falta de perspectiva feminina nos tribunais, nós precisamos contar com o olhar masculino dos juízes sobre causas que, muitas vezes, são sobre os corpos femininos e a liberdade sexual das mulheres”, aponta a especialista em entrevista à CAPRICHO.

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Mas como funciona a indicação no STF?

Como a própria Constituição determina, o cargo dos 11 ministros que compõe o STF é vitalício. Ou seja, cada membro tem direito a ocupar a vaga até sua aposentadoria, que pode ser solicitada aos 65 anos de idade e deve acontecer, obrigatoriamente, até os 75 anos.

Quando um ministro se aposenta ou em caso de morte, o presidente é o encarregado por indicar um novo nome. A pessoa escolhida precisa ter nacionalidade brasileira e estar com mais de 35 anos e menos de 75 anos. Além disso, é exigido que possua um notável saber jurídico (mas isso não significa que precisa ser formado em Direito, viu?) e ter reputação ilibada – que significa ser uma pessoa correta, íntegra e que não cometa atos corruptos. 

Após a indicação, o nome escolhido pelo presidente precisa passar por uma sabatina no Senado Federal. Nesse momento, ele será questionado sobre temas políticos, jurídicos e pessoais. No fim, os senadores apresentam um parecer e, se a maioria absoluta aprovar, acontece de fato a nomeação.

E cadê as negras no topo do Judiciário?

Antes de responder, vale dar um exemplo prático da função da corte. Nesta quinta-feira (30), o STF formou maioria para derrubar a prisão especial para quem tem diploma de ensino superior. Foi concluído pelo colegiado que não existe uma “justificativa razoável, com fundamento na Constituição Federal, para a distinção de tratamento no sistema prisional com base no grau de instrução acadêmica.

“A extensão da prisão especial a essas pessoas caracteriza verdadeiro privilégio que, em última análise, materializa a desigualdade social e o viés seletivo do direito penal e malfere preceito fundamental da Constituição que assegura a igualdade entre todos na lei e perante a lei”, concluiu o ministro Alexandre de Moraes, que foi relator do caso.

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Em entrevista à CAPRICHO, Maria Sylvia Aparecida de Oliveira, advogada e coordenadora de Políticas de Promoção da Igualdade de Gênero e Raça do Geledés Instituto da Mulher Negra, destaca o racismo que está no pano de fundo dessas desigualdades sociais. Para ela, a nomeação de uma mulher negra ao STF seria uma forma do presidente Lula demonstrar que ele, realmente, quer combater o racismo na nossa sociedade, que se dá também de forma institucional.

Segundo pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), apenas 12,8% dos magistrados brasileiros são negros, contra 85,9% brancos. Ao olhar para as posições mais altas com o recorte de gênero e raça, o levantamento aponta que 73,8% de servidoras brancas também possuem cargo de chefia, enquanto apenas 24,2% servidoras negras ocupam esses cargos.

Em 132 anos de história, o STF teve  três ministros homens negros. O último deles, Joaquim Barbosa, se aposentou em 2014.

“Acredito que não existe uma população mais comprometida com a Constituição do que as mulheres negras.”

Maria Sylvia diz que as pessoas têm a falsa ideia que não existem negros – e muito menos mulheres negras – que são competentes para assumir grandes responsabilidades no Judiciário. “Mas nós temos”, enfatiza mais de uma vez. Um exemplo é a jurista Vera Lúcia Santana de Araújo, que chegou a aparecer como candidata à uma vaga no STF. Ela faz parte da Executiva Nacional da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e da Frente de Mulheres Negras do Distrito Federal e Entorno.

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A especialista diz que além da competência, o olhar delas nesse ambiente é muito necessário. “Uma mulher preta sabe o que é carregar o racismo nas costas. Certamente, nesse sentido, ela terá o olhar mais apurado para as decisões do STF que são pautadas pelo entendimento e interpretação da Constituição Federal”, conclui a coordenadora do Geledés.

 

 

 

 

 

 

 

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