Mulheres com seios grandes não aguentam mais serem sexualizadas

Vincular o corpo feminino com curvas e seios maiores a algo 'vulgar' é um pensamento comum de boa parte da sociedade

Por Mavi Faria Atualizado em 29 out 2024, 16h06 - Publicado em 8 mar 2024, 16h19
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corpo feminino sempre é julgado, analisado e muito sexualizado. Na puberdade então, quando ele começa a se transformar, nem se fala. Não são raros os olhares e comentários ‘socialmente acordados’ sobre essa mudança de criança para mulher – sem a preocupação de entender como está sendo para a garota passar por essa fase que por si só já é tão complexa pelos hormônios.

É nessa fase que os seios, à medida que crescem, ganham atenção. Meninas são aconselhadas a esconderem os seios e evitar decotes para não darem a entender que estão ‘se oferecendo’ ou ‘se mostrando demais’. Ao mesmo tempo, muitas jovens sonham em colocar prótese de silicone para ter os seios perfeitos. Pois é, desde cedo, é desenvolvida uma relação complexa entre a mulher e seus seios porque parece que, independente do tamanho, nunca será bom o suficiente – assim como o corpo feminino, de modo geral.

Contudo, muitas vezes, existe uma diferença grande do julgamento para quem tem seios pequenos e grandes: as primeiras são sexys e descoladas, podem usar renda e tecidos transparentes, enquanto as segundas são vulgares ao usarem qualquer peça que deixe à mostra esta parte do corpo. 

Não é difícil pensar assim. Nas passarelas, espaço onde os padrões de beleza são cultuados em seu máximo, é raro observar uma modelo com seios mais avantajados. Os corpos extremamente magros, mesmo depois de toda onda de body positive, ainda são o padrão visto com constância. Isso não significa que os peitos são ignorados pelas produções de moda, na verdade são utilizados como inspiração – mas isso não significa que são, em suas formas mais diversas, aceitos dentro da passarela. 

A fashion designer Karoline Vitto afirmou em entrevista para a Hypebae que a falta de modelos com seios maiores se deve a sexualização extrema depositada nestes corpos, que não são vistos como ‘legais’ e ‘novos’ o suficiente pela indústria. Ela diz diz que uma mesma peça, em um corpo com seio pequeno e em um grande, vai ser vista como mais ‘sexy’ em quem possui mais busto, mesmo que “nem sempre essa seja a mensagem que queriam passar, e só estavam existindo em seus corpos”.

Vincular o ‘sexy’ e até o ‘vulgar’ no corpo feminino com mais seios é uma ação feita com naturalidade por boa parte da sociedade, o que, para Lorena de Oliveira, doutoranda em sociologia pela Universidade de Brasília, é justificado também pela representação corporal feminina presente na pornografia, onde as mamas são ainda mais sexualizadas e, quanto maior, melhor. 

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Ela explica que os seios possuem a ambiguidade de serem considerados bonitos e, ao mesmo tempo, de não serem tão expostos. A régua da medida entre quanto deve expor e onde deve ser exposto não é nosso, mas de uma sociedade machista que ainda privilegia o julgamento do homem

O seio feminino vai ser julgado e avaliado de diferentes formas dependendo da pessoa ou do ambiente, mas ele sempre vai ser sexualizado, independente da vestimenta, principalmente se for um seio avantajado”, comenta Lorena.

Pouca idade, mas muita expectativa

Os seios – assim como todo corpo feminino – são tratados como algo público que deve ser opinado há séculos porque o desejo de controlar a mulher também não surgiu ontem. Lorena lembra que, em todo período histórico brasileiro, há indícios de que o corpo feminino foi sexualizado, controlado e violado por muitos anos, principalmente quando trata-se de mulheres pretas.

Na busca por manter o controle sobre as mulheres, foi entendido que o julgamento sobre seus corpos era e ainda é uma tática que funciona, impondo socialmente o que deve vestir e como se comportar. Esse poder, segundo Lorena, estabelece o que é esperado ou não do corpo feminino, ou seja, uma meta impossível de ser alcançada. 

“É melhor e mais fácil manter mulheres com insegurança sobre o corpo controladas do que deixá-las serem livres e vestirem o que se sentem bem”, pontua a doutoranda em sociologia. 

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A carga, apesar de antiga, continua recaindo sobre jovens meninas que, na transição da infância para a adolescência, se veem cercadas de expectativas. A atriz Sydney Sweeney já revelou ao The Sun que, por desenvolver seios antes das outras meninas, foi excluída do grupo. Além disso, ela também comentou que até os dias de hoje, suas habilidades de atuação são descredibilizadas pelo seu corpo. “[Pensam que] eu tenho seios grandes, sou loira e isso é tudo o que tenho”, afirma.

Um ano depois da entrevista para o jornal norte-americano, os julgamentos continuam o mesmo. No X (antigo Twitter), não é difícil encontrar algum comentário que resume as atuações de Sydney ou a conquista de seus papéis ao seu corpo. 

Por que rotular e julgar mulheres como Sydney, que tendem a não utilizar roupas que escondam seus seios e sim os valorizem? A resposta abrange até mais do que os seios, mas é fácil de entender: socialmente, aprendemos a nos desagradar quando vemos uma mulher que mostra o corpo e se sente livre para vestir o que gosta

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É melhor e mais fácil manter mulheres com insegurança sobre o corpo controladas do que deixá-las vestirem o que se sentem bem”, explica a doutoranda em sociologia. Conectar a ideia do corpo e seio pequeno à magreza, que é ‘legal’, e o ‘feio’, ‘vulgar’ ao seio mais robusto é continuar prendendo meninas e mulheres em um padrão de corpo muitas vezes perigoso, que pode levá-las ao adoecimento.

Tudo que ‘excede’ e é além do esperado é automaticamente rotulado por ‘muito grande’, ‘errado’, e, neste ponto, a gordofobia aparece. Seja o corpo gordo, o seio maior, seja as pernas mais grossas, meninas e mulheres ainda são colocadas no lugar de quem ‘não se cuida’, ‘está exagerando’ e ‘não está preocupada com a saúde’. Quando usa uma roupa transparente ou mais sexy, a vulgaridade aparece em questão.

No Ano Novo de 2024, a influenciadora Lettícia Muniz foi alvo dessa métrica ao usar um vestido sem alças transparente, quando um veículo de notícia afirmou que ela “escandaliza ao surgir com seios imensos à mostra”. No mesmo período, a cantora Anny Gabrielly utilizou o mesmo vestido em outra postagem nas redes, mas nenhum comentário ou matéria afirmando que ela estava “escandalizando” com seus seios foi postado. 

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Para quem tem seios grandes, a reflexão sempre gira em torno de: estou me mostrando demais ou só estou existindo com minhas mamas do tamanho que são? No TikTok, a trend “eu estou me exibindo ou eu só existo?” foi utilizada por diversas meninas que possuem seios maiores e… Existem!

@thaiismusic

we should me allowed to just be, you know? #midsize #curvy #bodypositivity

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@brandismith616

#duet with @noemi.com.mx #fyp #publicserviceannouncement #stopshamingwomen #women #BbStyleFearlessly

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@therealmelindastrauss

I’ve always wanted to use this sound but I don’t usually have much cleavage 🤣 The dress is Miss Selfridge from @asos nycnightout finaloutfit fitcheck jewtok

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Embora muitas minas sentem a mesma pressão e expectativa sobre seus corpos, não é fácil sentir que está tudo bem ser do jeito que você é ou amar o próprio corpo. A imagem ideal imposta é repetida, muitas vezes, dentro de casa, pelos amigos e constantemente nas redes sociais. Mesmo assim, o corpo continua sendo seu, meu e nosso, e de mais ninguém. Quanto mais minas conseguirem entender isso, mais fraca a imposição social fica. E não somos poucas, viu? Confira alguns relatos de meninas nas redes:

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Chega! Mulheres não aguentam mais serem sexualizadas por terem peitos grandes ou por estarem vestindo uma roupa que gostam. 

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