O impacto de Sintonia: a despedida do fenômeno que deu voz à periferia

A série da Netflix chegou ao final alcançando o topo do ranking global da plataforma entre as produções de língua não-inglesa

Por Arthur Ferreira 15 fev 2025, 15h01
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epois de cinco temporadas de sucesso, Sintonia se despede da Netflix deixando um legado inegável. Criada por KondZilla, a série trouxe para as telas uma representação autêntica das periferias de São Paulo, abordando a música, o crime e a fé com profundidade e sensibilidade.

A série, que se tornou a maior franquia original da Netflix no Brasil, conquistou o topo do ranking global de séries de língua não inglesa em 2023. Com cinco temporadas, Sintonia se destacou como a produção brasileira original mais duradoura da plataforma. Mais do que um fenômeno do streaming, Sintonia abriu portas para talentos periféricos e colocou temas urgentes em pauta.

 

Retrato fiel da favela e de seus desafios

Desde sua estreia em 2019, Sintonia se destacou por retratar a realidade das comunidades sem filtros ou romantização. A série acompanhou a trajetória de Doni (Jottapê), um jovem que sonha em viver de música, Rita (Bruna Mascarenhas), que busca um futuro melhor através da religião e da educação, e Nando (Christian Malheiros), que se envolve com o crime na tentativa de mudar de vida. Cada um representa um recorte da juventude brasileira, suas aspirações e dificuldades.

A autenticidade foi um dos grandes trunfos da produção, trazendo um olhar de dentro para fora da periferia. Diferente de muitas obras que tratam o tema com distanciamento, Sintonia mergulhou na rotina desses jovens, explorando as dificuldades de se manter no ensino superior, a tentação do tráfico como alternativa financeira e os desafios da carreira artística para quem não tem privilégios.

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Uma porta para novos talentos

Além dos protagonistas que cresceram junto com a série, Sintonia foi responsável por dar visibilidade a muitos atores de origem periférica, incluindo ex-presidiários que participaram do coletivo de teatro Do Lado de Cá, na penitenciária Desembargador Adriano Marrey, em Guarulhos. Esse projeto possibilitou que ex-detentos recebessem formação teatral ainda dentro da prisão, o que os preparou para integrar o elenco da série.

Um dos exemplos mais marcantes é Leonardo Campos, que interpretou Lindão. Condenado por roubo de carro em 2014, ele passou quatro anos na cadeia e enfrentou dificuldades para conseguir trabalho ao sair. Sintonia mudou sua vida. “Se não fosse a série, talvez eu estaria procurando emprego até hoje, porque eu passei em todas as entrevistas que prestei, mas era rejeitado quando pediam registro de antecedentes criminais”, revelou ao Estadão em 2019.

Música, representatividade e impacto cultural

A trilha sonora sempre foi um elemento essencial em Sintonia, conectando a série ao público através do funk, rap e trap. A música não era apenas pano de fundo, mas parte da narrativa e da identidade dos personagens.

Para celebrar o encerramento da série, a Netflix organizou O Último Baile, evento que reuniu 14 mil fãs no Memorial da América Latina, em São Paulo. O festival contou com shows de nomes como Racionais MC’s, MC Hariel, Tasha & Tracie, Duquesa, MC IG e MC Menorzinha, reforçando o impacto cultural da série e sua ligação com a música.

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A CH esteve no evento e conversou com fãs da série sobre os momentos mais impactantes da produção. Confira:

@capricho

Quais foram os momentos mais marcantes de Sintonia para você? 🎬✨ A gente perguntou para os fãs no Sintonia – O Último Baile, um festival que reuniu vários artistas e que celebra a quinta e última temporada da série e que está acontecendo agora no Memorial da América Latina, em São Paulo. E o resumo é: o corre emocionou! E aí, qual foi o seu momento favorito de Sintonia? Conta pra gente nos comentários! 🖤

♬ som original – Capricho – Capricho

Um final à altura

A quinta e última temporada de Sintonia chegou ao catálogo da Netflix no dia 5 de fevereiro de 2025, encerrando um ciclo de sete anos. A nova fase mostrou os protagonistas lidando com as consequências de suas escolhas: Nando tentando um último golpe, Rita alcançando o sonho de se tornar advogada e Doni encarando desafios na gravadora VA Records.

O final encerrou com chave de ouro aquilo que a série construiu ao longo das temporadas. Sintonia provou que a periferia pode ser retratada com profundidade, sem cair em estereótipos que reduzem personagens negros e favelados a vilões ou meros coadjuvantes na narrativa. A série trouxe protagonistas complexos, com sonhos, dilemas, trajetórias reais e mais importante: com finais felizes, fugindo da visão tradicional do audiovisual em jovens da favela costumam aparecer apenas como criminosos ou vítimas.

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Essa representatividade importa — especialmente para quem cresceu sem ver sua realidade refletida de forma digna nas telas. Assistir Doni, Rita e Nando enfrentando desafios, tomando decisões e buscando um futuro melhor não apenas humaniza essas histórias, mas reforça que há possibilidades além dos rótulos impostos pela sociedade.

Mais do que um sucesso de audiência, Sintonia deixa um legado que abre espaço para novas narrativas e reafirma a importância de pessoas marginalizadas terem a oportunidade de contar suas próprias histórias.

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