
Caso de Mari Ferrer não ficou no passado e ainda será julgado no STF
STJ rejeitou anulação da audiência em que influenciadora foi humilhada e agora caso chega à corte máxima do país, com o ministro Alexandre de Moraes.
o último dia 17 de dezembro de 2024, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) negou um recurso especial apresentado por advogados da modelo e influenciadora Mariana Ferrer. Assim, o tribunal rejeitou a anulação da audiência que absolveu o empresário André Aranha, acusado de estuprá-la em uma boate em Florianópolis (SC), no ano de 2018.
CAPRICHO obteve com exclusividade documentos em que o ministro do STF (Superior Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, determina que o julgamento do recurso apresentado por Ferrer seja feito pela corte máxima do país. Ou seja, o caso será julgado pelo Supremo, mas ainda não há uma data para acontecer.
Importante lembrar: o caso teve repercussão nacional à época pela maneira como a jovem foi tratada em audiência sobre o estupro que denunciou à Justiça. Em vídeo divulgado pela imprensa, ela é humilhada e tem sua reputação questionada pelo advogado de defesa do réu. Atualmente, a “Lei Mariana Ferrer”, aprovada pelo Congresso Nacional, proíbe que vítimas e testemunhas de crimes sexuais sejam humilhadas ou constrangidas durante o processo.
No recurso a qual a CAPRICHO teve acesso, a defesa de Mariana pede a nulidade da audiência realizada em novembro de 2020, ou seja, pede que a audiência seja anulada. Nela, não só Aranha foi absolvido, mas a modelo, na condição de assistente de acusação, foi humilhada e atacada verbalmente pelo advogado do réu.
O STJ, entretanto, por unanimidade, votou pela inexistência da anulação, justificando que examinar novamente as provas não seria possível, mantendo a decisão do juiz Rudson Marcos, do TJ-SC (Tribunal de Justiça de Santa Catarina).
A defesa de Mariana se baseou no artigo 155 do Código de Processo Penal, que diz que um juiz não poderá fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, devendo levar outros elementos em consideração.
O STJ, sob relatoria do ministro Sebastião Reis Jr., afirmou que o pedido de anulação de audiência não foi feito dentro do rito e tempo processuais adequados, e negou a tese de que a vítima teria sido impedida de apresentar sua versão dos fatos durante a audiência realizada em 2020.

Antônio Saldanha e Rogério Schietti, outros ministros do STJ, também rejeitaram o recurso e mantiveram a absolvição de Aranha. Enquanto Saldanha afirmou que após avaliação completa do processo a decisão de absolvição era válida, Schietti destacou que nem mesmo a Lei Mari Ferrer prevê como consequência a nulidade de um processo, e também disse que o pedido deveria ser feito em outro momento de forma que o impacto das alegações da acusação na construção das provas pudesse ser analisado.
Mas e os advogados da Mariana nisso, CAPRICHO?

Após a decisão do STJ, o advogado Júlio Cesar F. Fonseca, que representa Mariana, disse respeitar o entendimento do STJ, apesar de discordar.
“A questão decidida pelo STJ não adquire tanta relevância, tendo em vista que, em 2024, a Primeira Turma do STF, tendo como relator o ministro Alexandre de Moraes, à unanimidade, deu provimento à Reclamação Constitucional promovida por Mariana determinando que o Recurso Extraordinário, já proposto perante ao TJSC, seja remetido àquela Corte, para analisar a essência do devido processo legal, qual seja, a nulidade da audiência. Portanto, a questão agora vai ser reavaliada pelo STF sob o ângulo constitucional”, afirmou em entrevista exclusiva à CAPRICHO.
De fato, uma decisão do ministro Alexandre de Moraes datada de 26 de fevereiro de 2024, obtida com exclusividade pela CAPRICHO, mostra que Moraes determinou que o recurso especial seja analisado pelo STF.
“Diante do exposto, com base no art. 161, parágrafo único, do Regimento Interno do STF, julgo procedente o pedido, determinando o encaminhamento do Recurso Extraordinário a este Supremo Tribunal Federal.”, diz trecho do voto do ministro.
“Trata-se de nulidade absoluta, não existindo preclusão sobre a matéria, podendo ser alegada em qualquer grau de jurisdição.”
Júlio Cesar F. Fonseca, advogado de Mariana Ferrer
O recurso em questão, em que Alexandre de Moraes foi o relator, destaca a conduta do advogado de Aranha e do juiz do caso durante a audiência.
O documento ressalta a importância da palavra da vítima em casos de estupro de vulnerável e afirma que após Mariana ser “humilhada e achincalhada pelo advogado de defesa contando com a omissão do juiz de direito”, ela teve seu direito violado e não conseguiu expor os fatos do crime após o abalo psicológico sofrido.
As sessões que decidiram pelo encaminhamento do recurso ao STF foram realizadas pela Primeira Turma do STF, em sessões virtuais de 16 de fevereiro a 23 de fevereiro do ano passado, compostas pelos ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin.
Ainda em entrevista à CAPRICHO, o advogado Júlio Cesar F. Fonseca destacou que o pedido de nulidade da audiência poderia ser feito em qualquer momento do processo, mais uma vez discordando da decisão.
“A questão da nulidade foi formulada no recurso de apelação e citada no acórdão do TJSC. Além disso, ainda que não tivesse sido mencionada, trata-se de nulidade absoluta, não existindo preclusão sobre a matéria, podendo ser alegada em qualquer grau de jurisdição, podendo, inclusive, ser declarada de ofício. Enfim, o STJ tratou uma nulidade absoluta como sendo relativa”, concluiu.
O que diz a defesa de André Aranha

Além de o julgamento do STJ ter acontecido após Alexandre de Moraes determinar que o caso fosse encaminhado para o STF, no dia 23 de maio de 2024 a ADPF 1107, sob relatoria da ministra Cármen Lúcia determinou por unanimidade que todos os processos onde há questionamentos sobre o histórico de vida da mulher vítima de violência devem ser anulados. Essa decisão da ministra Cármen Lúcia, inclusive, cita o caso de Mariana e a Lei Mariana Ferrer, que foi sancionada em novembro de 2021.
Em contato com a CAPRICHO, Dora Cavalcanti Cordani, advogada de Aranha, comemorou a decisão do STJ e se mostrou otimista em relação a um novo julgamento.
A decisão do STJ foi absolutamente justa e correta. A expectativa da defesa é que o STF também confirme a absolvição.
Dora Cavalcanti Cordani, advogada de André Aranha
“A decisão do STJ foi absolutamente justa e correta. A expectativa da defesa é que o STF também confirme a absolvição, por ser a única resposta possível diante da farta prova produzida ao longo do processo, tantos laudos periciais, quanto depoimentos de mais de 10 pessoas que estiveram naquele dia”.
Ela ainda completou destacando que o fato de o processo não ser anulado não representa um endosso à forma como a audiência aconteceu, dizendo se tratar de um caso delicado.